terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Formar lideranças para salvar populações


Na hora H do desastre climático e social, o Brasil descobre que além do desenvolvimento tecnológico e do aparelhamento da proteção civil, faltam ao Estado competências funcionais para coordenar as lideranças espontâneas que o povo organiza para salvar vidas. Desnuda-se o fosso mental que separa a elite que ainda domina o Estado e a grande massa que o dinamiza.

Estas são conclusões da maioria dos observadores da catástrofe que se abate sobre várias regiões brasileiras, desde os especialistas da ONU a todos os investigadores científicos e professores brasileiros, além dos cidadãos brasileiros. Reclamam publicamente que os seus estudos, projetos, ou informações colhidas no resto do mundo, têm sido engavetados por falta de aceitação política. E assim as cidades continuam a ser construídas com os erros, já apontados, através de décadas, tornando inúteis todo o investimento intelectual e tecnológico feito pelos profissionais especializados.


O povo percebe que em cada núcleo de atividade, técnica e científica, existente nos meios universitários que permanece isolado da realidade popular pela elite, existe o mesmo esforço pelo desenvolvimento nacional em bases democráticas, ou seja, para levar os grandes investimentos no campo educacional e científico a prestar serviços diretos à população. E mais, que estes sérios cientistas e técnicos estão cansados de denunciar o mau uso do patrimônio adquirido por universidades e institutos de investigação que permanecem parados e desconectados da realidade nacional, inúteis na hora do desastre.

A Globo News promoveu um debate entre filósofos universitários (8/1/11) que tiveram o desplante de reconhecer que o nível do ensino está sendo prejudicado pela democratização da sociedade. Reconhecem que a “aristocracia” intelectual, brilhante no país, está sendo atropelada e não pode sequer falar em “elite intelectual”. Têm razão - graças ao fim dos governos neo-liberais, para não dizer graças a Deus!, que é a expressão cultural popular. Mas deviam ter um mínimo de sensibilidade (ou de inteligência normal) para não se apresentarem como mestres em filosofia e ética e defensores de uma elite que nada entende da realidade presente e menos ainda de solidariedade humana.

Foi preciso ocorrer um desastre imenso, que provocou a morte de centenas de pessoas e um prejuízo econômico incalculável, para o mundo reconhecer que é urgente colocar os recursos técnicos e científicos a serviço das populações. A segunda grande descoberta é que a gestão municipal, estadual e nacional, deve criar laços de integração (deixando de lado a velha mesquinha luta pelo poder pessoal) para se socorrer solidariamente, ao mesmo tempo em que na sua intervenção local estabelece fortes vínculos com lideranças sociais que são alertadas para os problemas que os radares caríssimos indicarem dentro dos laboratórios.

Não precisava de muita alta filosofia para chegar a esta lógica “da batata” (como se diz em Portugal) que a população de chinelas usa no dia a dia: de nada adianta ter uma brilhante elite e uma alta tecnologia desligadas da energia, e a energia é social, e o seu funcionamento exige organização dos que têm capacidade de tomar decisões e liderar os trabalhadores voluntários. Simples para o comum dos mortais.

São muitas as mudanças a serem feitas para habilitar o Estado brasileiro a funcionar como democrático, mas não se pode esquecer a necessidade de reciclar os seus representantes na idéia de inclusão social e adaptação da linguagem e da cultura às necessidades populares.

 Ainda carregamos muitos arcaísmos do tempo dos soberanos que já deixaram de existir por inúteis socialmente. Por exemplo, como é que se pode exigir a uma pessoa que recebe uma penalização (de uma posição de classe média C escorregou para E) - sendo idosa e vitimada, recebe uma pensão mínima, paga em outro país, de 429 reais mensais) por culpa do INSS que há 10 anos não consegue somar todos os anos trabalhados para chegar ao cálculo de uma aposentadoria, que explique pedindo vênia, ao Meritíssimo Juiz que ele não foi justo ao considerar que a situação não é de “Periculum Mora” pois há rendimento. Primeiro é preciso entender o latim depois utilizar o tratamento de Meritíssimo, apesar de pensar que não somos romanos de há dois milênios, e que só tem mérito quem é capaz de saber que no Brasil não se consegue viver com menos que o salário mínimo. Quem tem tempo, saúde para não cair em desespero, paciência para aceitar o diálogo com tal representante do Estado?

No caso dos alertas sobre as catástrofes, como é possível debater uma gestão inteligente e democrática com um funcionário que recebe o aviso de que em 6 horas haverá um desastre climático e não consegue completar a ligação para transmitir às prováveis vítimas? Um líder popular, de verdade, não desiste ao encontrar impedimentos burocráticos ou inércia de indiferente alienado. Vai a pé ou em lombo de burro, usa megafone ou o próprio pulmão para avisar gente rápida e esperta capaz de substituir a tecnologia da comunicação que falha.

A crise econômica que afetou os países mais ricos e Lula explicou que no Brasil foi contornada por uma gestão competente orientada pelo Governo. Hoje sabe-se que o desastre econômico foi produzido exatamente pelas falhas de gestão empresarial que, além de desviar lucros fabulosos para a elite alimentou bolhas de especulação financeira que arrebentaram sem recursos próprios.

È desta gestão incompetente ou fraudulenta que o Estado Brasileiro precisa se libertar, para não ficarmos com as bolhas especulativas de uma elite meramente intelectual que detém o controle do patrimônio científico e tecnológico para a sua auto-promoção. Para isto impõe-se desde já a recolha das opiniões dos profissionais que há dezenas de anos propõem soluções para a organização das cidades e dos serviços sociais que os políticos de turno engavetam ou enrolam em linguagens esdrúxulas de uma aristocracia falida.